segunda-feira, fevereiro 22, 2016

A ESCOLA MUDOU. QUE MUDE A FORMAÇÃO DE PROFESSORES!


O livro - A escola mudou. Que mude a formação de professores! – trata-se de uma obra concisa, com apenas 138 páginas que se subdivide em cinco capítulos e/ou artigos sobre autoria de seis autoras. A referida obra encontra-se na sua 3ª edição pela Papirus, Campinas – São Paulo, esta faz parte da coleção Magistério: Formação e Trabalho Pedagógico, que engloba diferentes ângulos da problemática educacional.
A respectiva produção foi organizada por Ilma Passos Alencastro Veiga, a qual possui Bacharelado e Licenciatura em Pedagogia pela Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Goiás (1961), Licenciatura em Educação Física pela Escola Superior de Educação Física de Goiás (1967), mestrado em Educação pela Universidade Federal de Santa Maria (1973), doutorado e pós-doutorado em Educação pela Universidade Estadual de Campinas (1988). É professora Titular Emérita e pesquisadora associada sênior da Universidade de Brasília. É professora do Centro Universitário de Brasília onde coordena a Assessoria Pedagógica da Diretoria Acadêmica. Tem experiência na área de Educação, atuando principalmente nos seguintes campos: formação de professor, didática, educação superior, docência universitária e projeto político-pedagógico. Orientadora de dissertações, teses e supervisora de atividades de pós-doutoramento. Atualmente, é membro da Comissão de Supervisão Pedagógica dos Cursos de Formação de Professores na área de Pedagogia da Secretaria de Educação Superior, do Ministério de Educação. A outra organizadora é Edileuza Fernandes da Silva, graduada em Pedagogia pela Universidade Católica de Brasília, especialista em formação de professores para a Educação Básica pela Universidade de Brasília, mestre e doutora em educação pela UnB. Professora da Secretaria do Estado do Distrito Federal há 23 anos, coordenadora da implantação do ensino fundamental de nove anos no Distrito Federal entre 2006 a 2007. Foi professora colaboradora no curso de Pedagogia para professores em exercício no início de Escolarização, além disso, foi docente do curso Professor Nota 10 e no curso de especialização em Docência Universitária no Centro de Universitário de Brasília. Atua como pesquisadora da área de desenvolvimento profissional docente da Faculdade de Educação da UnB.
Conforme já descrito, a referida produção se subdivide em cinco capítulos e/ou artigos, quais sejam: a formação de professores: um campo de possibilidades inovadoras de autoria de Ilma Alencastro Veiga e Cleide Maria Quevedo Quixadá Viana; um currículo para a formação de professores de Lívia F. F. Borges; as práticas pedagógicas de professores para a educação básica: entre a imitação e a criação sob autoria de Edileuza Fernandes da Silva; educação continuada de professores no espaço-tempo da coordenação pedagógica: avanços e tensões, produzido por Rosana César de Arruda Fernandes; educação continuada: uma experiência vivenciada nos anos iniciais do ensino fundamental de nove anos de Maria Antônia Honório Tolentino. As reflexões que seguem, portanto, são resultados parciais de pesquisas stricto sensu produzidas com base na experiência formativa e vivências pedagógicas das respectivas autoras.
O primeiro capítulo tem como fio condutor das discussões, dois questionamentos que irão permear por todos os argumentos contidos na referida obra: a formação de professores está voltada para qual contexto social e para qual escola básica? Nesse contexto, as autoras tecem reflexão para enfatizar que com um histórico técnico-instrutivo decorrente do contexto social em que a maioria dos professores foi formada será simples substituí-los por máquinas, no entanto, se desconstruirmos alguns valores patriarcais que foram arraigados em nós, será possível percebermos que há singularidades no educador que são insubstituíveis, que aprender-ensinar é uma atitude impregnada de sensibilidades que precisam ser consideradas no contexto da educação formal. Para tanto, enfatizam a importância de perceber que a formação humana precisa ser compreendida em sua essência, desde seu sentido etimológico ao seu poder de exalar a compreensão de que a relação entre o pensamento e a ação depende da finalidade a que o ser humano se propõe. E que, portanto, por mais que haja distinção entre o real e o ideal, é necessário entendermos que a formação de professores exige um compromisso de aliança entre esses extremos e que a articulação entre os interesses individuais e coletivos precisam ser compreendidos dentro dessa esfera de formação.  Salientam ainda que, a formação para o desenvolvimento humano do professor é ação vital para a melhoria da escola, destacando a imprescindibilidade do educador no cenário desafiador da sociedade contemporânea e apresentando as características que este deve ter como agente social, bem como a necessidade de conhecimento das políticas educacionais e do contexto social, cultural e tecnológico ao qual estamos envoltos.
O segundo capítulo aborda um currículo para a formação de professores e apresenta a escola como espaço da educação formal e institucionalizada, destacando as profundas modificações demandadas pela sociedade atual, bem como o papel do educador neste contexto de mudança. Para tanto, a autora traz as percepções de alguns teóricos que apresentam a lógica do currículo tradicional e a implicação para a criação de outro currículo, formativo.  A autora destaca que a formação do educador por meio da pesquisa pode ser o diferencial na formação de um pesquisador inquieto sempre a busca de novos conhecimentos, tal qual exige a sociedade contemporânea. Nessa perspectiva, destaca ainda que as políticas públicas educacionais devam centrar forças na construção de um currículo para a formação de professores que tenham como ponto de partida o protagonismo docente-discente, explicita que para a construção desse currículo integrado, é necessária uma sólida formação teórica cultural que remete a três dimensões: reconhecimento de um escopo teórico e de um cabedal cultural que demarca a especificidade da docência como profissão; construção cultural desse repertório sujeito às relações de produção do conhecimento; prática investigativa que deve partir da reflexão sobre a própria prática docente.  A autora constrói seus argumentos em prol de uma organização curricular que considere a participação de todos os atores imbricados no processo formativo, enfatizando que a integração curricular só pode acontecer quando se considera as diferentes malhas dessa rede complexa e instigadora que compõem os sistemas educativos em suas diferentes esferas.
No terceiro capítulo discute-se a educação básica no atual cenário educacional que, segundo o entendimento apresentado há um campo fértil para compreendermos a formação de professores, com destaque a concepção freireana. Para tanto, a autora salienta a experiência pedagógica de quatro professoras do Distrito Federal, tendo como subsídio de compreensão o portfólio.  Destaca ainda a importância de perceber o contexto ímpar de cada atuação, enfatiza que a prática do professor deve ser revestida de intencionalidade para que o mesmo possa compreender seus percalços e potencialidades, bem como distinguir e caracterizar os diferentes níveis que envolvem a práxis. Neste cenário, aborda o paradoxo entre as diferentes práticas educativas, além da necessidade da formação técnico-científica do educador para compreender os lances de um saber consciente que contribua para o desenvolvimento de uma prática pedagógica que rompa com a seleção e a exclusão.
O quarto capítulo traz para o foco da discussão os avanços e tensões que envolvem a coordenação pedagógica no âmbito da educação continuada de professores, com ênfase em uma escola da rede pública de ensino do Distrito Federal, espaço de pesquisa de mestrado da autora. Vale trazer a descrição da autora quando destaca que a escola atual preservou as características de sua origem e se estrutura muito mais como uma escola seletiva do que como espaço inclusivo. Para esclarecer tal percepção destaca três eixos principais de discussões: educação continuada, trabalho docente e coordenação pedagógica. A partir daí, com base nas falas das suas interlocutoras, a autora vai tecendo suas considerações sobre a necessária articulação entre a teoria e a prática.  Nesse viés, enfatiza a necessária implementação coletiva do projeto político pedagógico como referencial articulador da formação continuada destacando a coordenação pedagógica na rede pública de ensino do Distrito Federal, onde o espaço-tempo dessa atuação se constitui como pontos importantes para o fortalecimento do coletivo e, consequentemente, para a organização do trabalho pedagógico da escola e dos professores. A autora descreve o percurso de atividade da coordenação pedagógica no cenário supracitado, enfatizando que a ação compartilhada que envolve o trabalho coletivo e participativo deve ser construído paulatinamente a partir das reflexões coletivas, compreendendo que nem sempre o olhar avaliativo do Estado segue a mesma direção do olhar pedagógico dos profissionais envolvidos com a educação, fator que aumenta o desafio desses profissionais na condução do percurso que se quer construir no processo de ensino e de aprendizagens.
O quinto capítulo apresenta a discussão sobre a formação continuada, com base em uma experiência vivenciada nos anos iniciais do ensino fundamental de nove anos. Segundo a autora, os profissionais da educação buscam referenciais que favoreçam a reflexão crítica do trabalho que realizam, esse fator desafia os organizadores de formação continuada, que priorizam desmistificar o imaginário, instituído historicamente, da distribuição de receitas, métodos e técnicas de ensino. Nesse intuito, a autora destaca o protagonismo de professoras formadoras ao organizar um programa de educação continuada para os professores alfabetizadores no Distrito Federal. Contexto no qual salienta o percurso histórico da alfabetização, as leis que regem o processo e a criação de um Centro de Referência da Alfabetização/CRA que realiza a formação continuada.
É no contexto supramencionado que se desenvolve a pesquisa descrita pela autora visando compreender a articulação do trabalho pedagógico, especialmente no que tange ao diálogo com os alfabetizadores. A partir das descrições é possível observar o papel e a função específica de cada um no desenvolvimento das atividades pedagógicas, fator que contribui para o resultado satisfatório da ação do coletivo. O trabalho realizado pelas equipes do CRA priorizou a organização do trabalho docente dos professores alfabetizadores, instituindo uma avaliação processual e um acompanhamento do trabalho docente, por meio do atendimento direto às escolas que visavam discutir os problemas reais e articular coletivamente os meios de intervenção, com palestras e oficinas que buscavam romper com o imaginário social da apropriação de receitas e técnicas de ensino para a construção de uma reflexão crítica que abarca dimensões individuais e coletivas. Estes espaços só podem ser configurados por ações bem orientadas, organizadas e partilhadas, de uma maneira coletivamente estruturada.
A obra resenhada apresenta pontos cruciais para o repensar a formação de educadores no âmbito do fazer pedagógico, com destaque a relação teoria-prática, a fim de que coletivamente se possam construir projetos que rompam com o tecnicismo e/ou reprodução de programas e projetos institucionais para a autoria de educadores que vivenciam a prática em sala de aula. Neste sentido, António Nóvoa (2013), coaduna com as autoras ao destacar que para o desenvolvimento de uma nova formação de professores é preciso considerar três bases fundamentais: uma formação de dentro, a valorização do trabalho docente e pela criação de uma nova realidade organizacional. Nesta vertente, o autor destaca que a formação de professores deve considerar as reflexões pautadas no processo formativo que se realiza no espaço de desenvolvimento profissional. Ainda no viés apresentado, Marilda da Silva (2009, p. 36) também destaca que, “os professores aprendem muito compartilhando sua profissão, seus problemas, no contexto do trabalho. É no exercício de trabalho que, de fato, o professor produz sua profissionalidade”. Portanto, cabe, a nós educadores, retirar da formação a rigidez dos conteúdos programáticos, incluindo momentos para as liberdades que colorem o estar junto, trazendo nova dinâmica ao trabalho coletivo, pautados nos saberes das experiências.
Inscrever-se na história, conforme nos diz Paulo Freire (1996) é aprender a interpretar o mundo com todas as suas cores, saberes e sabores, valorizando o conhecimento e a cultura do outro, imprimindo magia ao movimento das diversidades que fortalecem nossa própria concepção do mundo vivido e do sonhado, compreendendo que a educação é um ato político-pedagógico que se efetiva nas vivências e nos delírios dos seres humanos.  Essa aprendizagem nos possibilita denunciar a educação pautada na docilidade e na submissão, engendrando outra concepção educativa que se matiza na busca constante por liberdade e emancipação. Importante perceber nesse contexto que para construir a trajetória delineada com autoria é necessária a ruptura ao sistema vigente, de modo a produzir estratégias teórico-metodológicas que dê conta de ressignificar o currículo, não apenas no espaço formativo, do debate e das reflexões, mais especialmente, no espaço da sala de aula.
O espaço formativo de educadores deve ter como mote pedagógico o prazer por aprendizagens coletivas, pois é o momento de teorizar a prática educativa com saberes diferenciados que devem se completar na legitimidade da produção escrita de autores que realizam reflexão sobre o campo educacional, não apenas para ‘engrossar’ as teorias educacionais, mas para dar subsídio à prática em sala de aula. Trata-se da espiral educativa que necessita se movimentar em várias direções para fortalecer os aprendizados tanto do educador quanto do educando. Momentos em que se precisam exercer as liberdades para construir juntos outras possibilidades metodológicas, contemplando as subjetividades humanas. No entanto, é um caminho árduo a ser construído, haja vista que a formação da maioria dos educadores foi pautada no individualismo exacerbado que os impossibilitam de aprender com o outro. Como salienta Martha Tristão (2004), está aí, na falta de relação interpessoal, o grande impasse para se trabalhar com equipes de diálogos dentro das instituições escolares, esse é, portanto, o entrave para se pensar em projetos inter ou transdisciplinares.
A leitura do livro - A escola mudou. Que mude a formação de professores! nos dá subsídio para relatar que se trata de uma obra relevante aos educadores em geral que visam discutir a formação de professores e articular meios de reflexões sobre o próprio processo formativo. Neste ínterim, a referida produção apresenta discussões centradas em três eixos que envolvem a formação docente como um campo aberto às possibilidades, as questões curriculares com seus paradoxos e probabilidades de rupturas ao sistema vigente e as práticas formativas de educadores das escolas públicas, buscando compreender na e com as experiências e com os processos originais, o percurso da educação básica e a importância de protagonismos nos cenários complexos e desafiadores da educação básica. No entanto, são desafios que de acordo com as pesquisadoras podem ser superados por educadores comprometidos e capazes de rever suas ações, concepções, organizações e avaliações em busca de construir coletivamente novos percursos educativos, com a convicção e a esperança de que é possível uma educação pública com qualidade social.
A resenha em pauta foi produzida por Maria Elizabete Nascimento de Oliveira, licenciada em Letras pela Universidade do Estado de Mato Grosso/UNEMAT, pós-graduada também pela UNEMAT em Língua Portuguesa e suas respectivas literaturas. Mestre em Educação pela Universidade Federal de Mato Grosso e, atualmente, é doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Estudos Literários pela UNEMAT. Autora do livro: Educação Ambiental e Manoel de Barros: Diálogos poéticos, publicado pela Editora Paulinas, São Paulo: 2012.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

VEIGA, I. P. A & SILVA, E. F. (orgs.). A escola mudou. Que mude a formação de professores! 3 ed. Campinas, SP: Papirus, 2012.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. Rio de Janeiro: Paz & Terra, 1996.
NÓVOA, António. Três bases para um novo modelo de formação. IN: Revista Nova Escola, Agosto/setembro-2013, p.52-55,  GESTÃOESCOLAR.ORG.BR
TRISTÃO, Martha. A educação ambiental na formação de professores: rede de saberes. São Paulo: Annablume, 2004.
SILVA, Marilda da. Complexidade da formação de professores: saberes teóricos e saberes práticos. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2009.


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