domingo, junho 10, 2012

O CICLO DE FORMAÇÃO HUMANA


LIMA, Elvira Souza. Ciclos de formação: uma reorganização do tempo escolar. São Paulo: S107, 2002. (col. Fundamentos para a educação).

Maria Elizabete Nascimento de Oliveira[1]

O livro – Ciclos de formação: uma reorganização do tempo escolar da autora Elvira Souza Lima, apresenta uma discussão interessante a respeito da ressignificação temporal da escola organizada em ciclos, política educacional existente, inclusive, em países latino-americanos, como Estados Unidos e; países europeus, caso de: Portugal, Espanha e França. Aborda ainda que, a preocupação com as formas de organização do tempo escolar, decorre dentre outras coisas, dos estudos de outras áreas sobre o desenvolvimento  humano e sua inserção no contexto sociocultural.
Segundo Elvira, necessário compreender que a organização da temporalidade fixa no âmbito pedagógico existe, não concepção dos educadores, pais e alunos, como também em documentos oficiais; além do material didático que, muitas vezes, se organizam de modo aprisionar o conhecimento. A herança desta organização de ensino é advindo do modelo europeu, exclusivamente do francês. A diversidade sociocultural vem exigindo alteração na temporalidade e na organização do fazer pedagógico, a fim de se adequar às necessidades e especificidades presentes no contexto escolar.
A autora exemplifica que, a mudança do tempo rígido para um tempo flexível permite ao educador utilizar de suas horas de trabalho de acordo com suas necessidades. Assim, faz-se urgente compreender a escola como espaço de formação, não apenas de aprendizagem, valorizando o desenvolvimento global do ser humano, portanto, não se trata de algo inventado  para acabar com a repetência e/ou com o fracasso escolar, mas de atribuir o tempo adequado a todos para a sua formação, o qual diferencia de um indivíduo a outro.
O ano cronológico e o ciclo de formação são apresentados de formas diferentes pela autora, enquanto o primeiro é um produto cultural, datado; o outro é de ordem biológica cultural. Neste sentido, a autora defende a concepção de um estudioso denominado Henri Wallon, ao abordar que a educação deve estar a serviço do ser humano e não servir aos interesses particulares. Além disso, relata com propriedade os princípios gerais desta perspectiva de aprendizagens, declarando que, quando surge a proposta de ciclos, esta se sustenta na ressignificação do processo de aprender, onde o currículo deve se pautar em um projeto de formação que contemple as diversidades, no qual os conteúdos sejam trabalhados como elementos mediadores do desenvolvimento humano. A proposta de ciclo de formação humana se ancora na teoria cultural-histórica do desenvolvimento humano que, considerando as proposições da autora supracitada, envolve várias funções psicológicas, conhecidas por Lev S. Vygotsk, como: memória, atenção volitiva, a percepção, a imaginação e o pensamento.
Ainda de acordo com Elvira, o estudo do conjunto das neurociências nos ajudam a compreender vários pontos do processo do ato de aprender e que a escola, neste viés, deve viabilizar a socialização de informações e intrumentos culturais, atendendo as pecualiaridades do desenvolvimento biológico e cultural do ser humano, ou seja, trata-se de abordar o conhecimento formal, promovendo o seu desenvolvimento cultural. Nesta conjectura, a implantação de ciclos de aprendizagens permeia por várias dimensões, dentre elas: a gestão, o currículo, a avaliação, a continuidade educativa, o trabalho em equipe e a formação do educador, estas estritamente relacionadas entre si.
No que tange à gestão, aborda a necessidade do diretor se ver como educador, ou seja, a urgência deste rever sua função, que deve ultrapassar do meramente administrativo para a dimensão pedagógica. Ou seja, a gerência das unidades de ensino precisa estar a serviço da ação educativa. Nesta proposição, também deve se pautar a práxis do educador, esta deve deixar de servir apenas a estrutura da instituição, mas conduzi-lo ao seu processo de formação, com iniciativa e tomada de decisão que contribuam para o fortalecimento da sua identidade profissional docente.
Ao abordar o currículo, a autora esclarece que antes de sua definição é preciso compreender a concepção do ser humano em desenvolvimento, para, desta forma, entender o objetivo de sua ação pedagógica. Neste foco, esclarece ainda que, todo currículo implica uma opção, uma definição do que seria o processo de humanização pautado na concepção  do educador. O currículo visto pela ótica da formação humana não pode estar fragmentado em disciplinas, em hierarquias ou no controle  das instituições, mas precisa estar situado historicamente, servindo ao desenvolvimento humano. Nesta proposição o currículo é politicamente situado, no qual as novas áreas do conhecimento vão se formando no desdobramento de outras áreas, ou são criadas como resultados de novas práticas culturais, ou ainda pela complexidade crescente do conhecimento e da tecnologia.               
No que se refere a complexidade do ato avaliativo, Elvira discorre que, por muito tempo, este foi visto como a memória de tempo curto que se diluia em testes e provas aritméticas. Assim, a avaliação é, segundo a autora, o primeiro eixo a ser alterado na implantação do ciclo, o que significa romper com a avaliação vista como progressão ou retenção para uma dimensão formadora do desenvolvimento humano. Neste foco, a avaliação é vista como processo, sendo diferenciada para cada ser humano, onde se observa os avanços e recuos como possibilidades de intervenção.
Quanto a continuidade educativa permitida pelo ciclo de formação humana, a autora aborda que, esta rompe com a concepção de término de aprendizagem ao final do ano letivo. Ou seja, enquanto na seriação há uma necessidade de cumprimento de prazos, cronogramas e/ou normas estabelecidas pelas instituições, no ciclo privilegia-se a flexibilização na alocação do tempo no cotidiano do aluno, que dialoga com as aprendizagens e saberes múltiplos, considerando o tempo necessário de cada ser humano para a sua aprendizagem.
No que tange à formação de coletivos, Elvira enfatiza a necessidade de um trabalho em equipe que fortaleça a responsabilidade pela formação do educador, pois esta passa a ser uma preocupação coletiva e o processo avaliativo implica nesta colaboração. Assim, a definição das ações pedagógicas a serem desenvolvidas devem ser, no mínimo, de responsabilidade dos  educadores que atuam no ciclo. Desta forma, necessário refletir sobre a concepção do ser educador, bem como, sobre a sua postura diante das mudanças significativas que transpõem a cultura do isolamento para uma atitude coletiva; cultura do comprometimento, da responsabilidade e do cuidado com o outro.
Quanto à formação do educador, este é visto também como ser humano em desenvolvimento e não como detentor do saber, a autora apresenta uma nova organização de formação continuada, em uma compreensão de mediador que promova o desenvolvimento humano por meio da aprendizagem, que se faça partícipe do processo da constituição de identidades. Discorre ainda que, em uma formação efetiva, o educador acaba por estabelecer uma relação diferente com o conhecimento e que, liberado da pressão do tempo cronológico, acaba por assumir o seu papel pedagógico de mediador da formação humana.
Enfim, embora trata-se de uma produção condensada, a autora apresenta pontos importantes à reflexão sobre o ciclo de formação humana e, finaliza suas arguições, reforçando com propriedade que,  o ciclo não foi pensado como solução para o fracasso educativo, como muitos educadores pensam, trata-se de uma proposta de reformulação necessária à organização escolar, no sentido de permitir a inclusão de todos os seres humanos no campo educacional.


[1]Coordenadora de Formação Continuada – CEFAPRO/Centro de Formação e Atualização dos   Profissionais da Educação Básica – Cáceres/Mato Grosso. Endereço eletrônico:  m.elizabte@gmail.com

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