domingo, junho 10, 2012



A POESIA DE MANOEL DE BARROS:
REENTRÂNCIAS PARA UM MUNDO PO-ÉTICOMaria Elizabete Nascimento de Oliveira


Os quatro elementos da natureza envoltos na cosmologia poética de Manoel de Barros, incita-nos a uma reflexão conturbada sobre sua identidade ecológica. Mas, também, reforça a proposição de que em seus escritos emergem a diversidade e, que, portanto, são fontes inesgotáveis de deslumbramentos.

II A LIBERDADE DA NATUREZA NA POÉTICA MANOELINA

O poeta, Manoel de Barros, afirma veementemente em seus escritos que o poema é uma coisa que não serve de nada, enquanto vida houver (APA, p.25). No entanto, é possível perceber, que ele apresenta o reencantamento do mundo, onde a verdade cristalizada cede espaço para as imagens incandescentes da imaginação. Se deixarmos nos contaminar por seus escritos, será possível perceber que (...) há mistérios nascendo por cima das palavras. Desordenadamente, como bucha em tapera. E moscas portadoras de rios (APA; p. 39). Portanto, é com o olhar de curiosidade sobre esses fetos e afetos, é que foi possível tecer as percepções que ora se anunciam.
Importante salientar, que para degustar a poesia de Barros, é necessário se despir dos pré-conceitos, este é um dos caminhos para compreendermos a incompletude das coisas e sua contribuição para a completude humana, que, no entanto, jamais, acreditamos que poderá ser acabada, tendo em vista que o mundo, como é possível perceber na poesia de Barros, se apresenta como fonte inesgotável de novidades e reentrâncias. Portanto, para conhecer o poeta, a fim de atribuir um dos elementos da natureza, é necessário deixar-se guiar pelas asas da sua palavra poética e, ao mesmo tempo, ser encosto do chão, para só assim, compreender o êxtase do nada, que permeiam por entre as poesias manoelinas. Sendo, para tal, preciso, se despir das verdades instituídas pelo poder hegemônico, pois Barros afirma que “para ser escravo da natureza o homem precisa de ser independente” (BARROS, Concerto a Céu Aberto, 2004, p. 62).
Assim, ao ler parte da produção bibliográfica do autor, é possível compreender que suas palavras são bonitas e selvagens, pois subvertem as normas impostas e voam nas asas incandescentes do pensamento fértil do poeta. Assim, para uma compreensão mais consistente, busco aparato teórico, na produção de Gastón Bachelard, (2001), que apresenta um vasto estudo sobre esses elementos e que, acredito, dá vazão a essas inferências.
Antecedida a esta discussão, no entanto, vale descrever outros fragmentos da produção barreana, que apresentam os elementos da natureza, para que percebamos que o autor permeia, com desenvoltura, por entre os quatro, destacando, a vivacidade desses vocábulos, no que tange aos sentidos que abarcam no contexto, no qual estão inseridos.
· Se a gente jogar uma pedra no vento ele nem olha para trás (PR)
· Quis pegar entre meus dedos a manhã. Peguei o vento. (idem)
· Sou puxado por ventos e palavras (OLDI p. 39)
· Língua de fogo é apenas uma imagem ( p. 65 PR)
· Vi um incêndio de girassóis na alma de uma lesma (idem).)
· A água lírica dos córregos não se vende na farmácia (Concerto a céu aberto, p. 52)
· Pessoa que lê água está sujeita a libélula (Concerto a céu aberto, p.51)
· Por meio de ser árvore podia adivinhar se a terra era fêmea e dava sapos –(Gramática expositiva do chão p. 15)
· E a terra se merecia de dar naquelas mãos até flor.(idem)

Percebe, assim, que os quatro elementos da natureza, encontram-se festivamente em sua produção, num bailar de novidades que percorre os veios da poética e atribui vivacidade e subversão a nova maneira de perceber as coisas do mundo, afinal, “não tem margens a palavra” (AA, 16). E, nesse sentido, o poeta declara que, ama arrastar algumas no caco de vidro, envergá-las pro chão corrompê-las, até que padeçam dele e o sujem de branco (AA20). Essa é a brincadeira mais séria desse encantador de palavras, que ao passear por entre os elementos da natureza e se diluir na matéria líquida, tece sentidos que se levantam, em prol da sustentabilidade planetária.

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